segunda-feira, 10 de março de 2014

"A maioria da classe política só está preocupada em ganhar eleição", diz o deputado Kelps Lima

O entrevistado da edição de hoje é o deputado estadual Kelps Lima (SDD). Na oportunidade, ele faz uma análise sobre o quadro político do Estado e aponta soluções. O parlamentar cobra projetos para a recuperação do Rio Grande do Norte.

O Mossoroense: O senhor dedicou o final de semana a contatos políticos em Mossoró e na região Oeste?
Kelps Lima: A gente está num processo de construção do partido em todo o Estado. Nós resolvemos passar oito dias no Oeste do Estado e vamos fazer visitas de Areia Branca até São Miguel, Pau dos Ferros, Apodi, Felipe Guerra, Caraúbas. São todos municípios que vamos visitar na construção do partido. Em paralelo a isso, aproveitamos a nossa permanência na cidade para identificar as demandas e conversar com as pessoas. Além de conhecer a cultura da cidade. Isso tudo é enriquecedor. Às vezes a gente fica estudando políticas públicas e lembra que precisa fazer interação com a base para poder saber se aquilo é compatível com a realidade local. Essa é uma experiência muito rica, que a gente valoriza muito. Você só consegue isso com calma, ficando em regiões diferentes daquelas que você está no cotidiano. É preciso mergulhar na cultura da cidade, nos projetos e nos problemas da população para poder visualizar soluções com ferramentas de gestão pública e governamentais existentes.

OM: Como está organizado hoje o Partido Solidariedade? 
KL: O partido é muito novo. Veio para o Rio Grande do Norte no dia 2 de outubro, quando a gente se filiou ao partido e iniciou esse processo. Nós temos pouco mais de cinco meses e nesse período a gente está construindo o partido no Estado. Estamos em aproximadamente 80 municípios, muitos deles em fase de regularização, onde há pessoas filiadas, mas a comissão provisória ainda não foi instalada. A gente também está nesse processo. Só agora instituímos o partido em mais cinco municípios da Região Oeste. Hoje temos aproximadamente 70 vereadores. Só que há uma preocupação de o Solidariedade não ser uma mera legenda. Tem que ser um partido que funciona organicamente, que tenha uma vida, um ideal, uma cara. Obviamente sem ser um partido excludente. A gente quer sim pessoas diferentes, de pensamentos diferentes e condutas diferentes para a gente fazer um bom mix e tirar algo interessante para poder propor algo de novo para a sociedade.

OM: O senhor tem adotado um discurso de se colocar como um diferencial em relação ao que está aí na política. O que o senhor acha que precisa ser feito para mudar a política do Estado?
KL: Primeiro, é que essa questão do diferencial precisa de uma referência. É diferente de quem? Eu me sinto muito próximo da média do cidadão potiguar. A média do cidadão potiguar, eu sou oriundo dela. Sou do Alecrim, filho de uma costureira, consegui o meu ingresso na universidade para poder ter uma vitória profissional, nunca fui candidato a nada. A primeira vez que fui candidato foi agora. Cheguei à Assembleia com o pensamento e a postura do cidadão comum. E o que aparenta ser um diferencial dentro do plenário da Assembleia na realidade demonstra o distanciamento que a maioria dos deputados está para o que de fato não é diferente. Essa aparente diferença que a gente tem na Assembleia demonstra outra coisa: o distanciamento que a maioria dos deputados tem do senso comum que luta por coisas diferentes na batalha cotidiana. A batalha deles (dos deputados) é pela manutenção do poder. Com um tempo você termina sendo engolido por um processo que de fato é muito tentador, que é você começar a se sentir compelido a ficar no poder e utilizar-se de mecanismos não tão legítimos para ficar no poder com aquela coisa de que os fins justificam os meios e você termina sendo engolido. Eu tenho muito cuidado com isso. Espero não ser mais um que venha a ser engolido. Às vezes as pessoas dizem: "Kelps será que com o tempo você não vai mudar?". E eu respondo: "essa preocupação é mais minha do que sua". Eu me preocupo e me policio mais cotidianamente do que qualquer pessoa. Eu fiz política estudantil a vida toda e fui muito feliz. Inclusive hoje (sexta-feira) fiquei muito feliz porque um colega de escola que encontrei no Itep que estudou comigo em Natal que lembrou que quando eu tinha 12 anos, já estava no grêmio escolar. Eu não o reconheci e ele me reconheceu e lembrou disso. Faço isso por vocação. Não tenho nenhum parente com trajetória política. É por vocação e o desejo de participar do processo político de transformação de nossa sociedade.

OM: O senhor tem um mandato bem avaliado, mas sempre lembram que o senhor foi secretário de Micarla. O que o senhor diz a respeito disso?
KL: Com extrema tranquilidade. Por dois motivos: primeiro é que é preciso se reportar ao período. Em 2008, Micarla foi eleita prefeita de Natal com mais da metade dos votos da população sem apoio de presidente da República, que inclusive veio a Natal pedir voto contra ela, a governadora pedia voto contra ela e o prefeito de Natal superbem avaliado pedia voto contra ela. A grande maioria da população de Natal, contra tudo e contra todos, elegeu Micarla. Eu fazia parte dessa grande maioria e continuei fazendo parte dela, quando achou Micarla ruim. Eu participei do primeiro ano do governo de Micarla. Fui um ano secretário dela. Nesse primeiro ano, a secretaria que nós administramos recebeu o prêmio de melhor política urbana do Brasil. Tanto é que só fui eleito deputado pelo reconhecimento do trabalho que fiz. Tanto é que dos 30 mil votos que tive, 20 mil foram na Grande Natal, oriundos desse trabalho de apenas um ano. Houve um reconhecimento muito grande do que nós fizemos. Realizamos a maior renovação de ônibus da história de Natal, a implantação do bilhete eletrônico nos ônibus... foi uma série de coisas reconhecida pela população. Infelizmente, o governo de Micarla começou a desandar e esse foi um dos motivos que nos fizeram sair do governo. Quando saímos, ela nem tava tão mal avaliada. Quem estava dentro, já enxergava que não estava caminhando para um lado bom. Como não tenho histórico de amizade e de relação partidária com Micarla, eu me senti muito à vontade no momento em que não me senti mais confortável e vi que o governo não estava trilhando um bom caminho e pedi o “boné” e voltei para a minha atividade de advogado. Após a minha saída, houve um apelo muito grande para a gente ser candidato a deputado. Eu achava até que não era possível se eleger deputado porque eu nunca fui candidato a nada e passei apenas um ano na secretaria, mas o reconhecimento ao trabalho fez com que a gente seja um dos únicos quatro deputados da Assembleia que não fazem parte de famílias tradicionais do Rio Grande do Norte. Dos 24 deputados estaduais, 20 são de famílias políticas. Sou um dos quatro que não pertencem.

OM: Como é o seu relacionamento com os colegas, tendo em vista que o senhor critica as práticas usadas por eles?
KL: Tem de tudo. Tem os que não gostam e demonstram que não gostam. Tem os que não gostam e não dizem. E tem aqueles que ignoram absolutamente. Tem deputado que diz: "é muito bonito isso que você está fazendo, mas eu estou aqui há 30 anos. Nunca fui oposição nem por 30 minutos e nunca perdi uma eleição. Com isso que você está fazendo vai perder a eleição. Se quiser ganhar a eleição, tem que fazer como eu: aderir ao governo e usar os mesmos mecanismos". Alguns deputados acham absolutamente inócuo o que eu faço, que não tem efeito nenhum e que entra num ouvido e sai pelo outro. Eu tenho muito respeito por todos os deputados, mas confesso que não tenho muita preocupação com o que eles pensam ou deixam de pensar sobre mim.

OM: Indo para a questão dos projetos. Por que existe essa falta de projetos crônica no Rio Grande do Norte?
KL: Porque não precisa de projeto para ganhar a eleição. A maioria da classe política só está preocupada em ganhar eleição. Na hora que a população colocar projetos como critério de exigência para ser candidato, esses projetos vão aparecer. Existe uma característica absoluta na classe política e todos os políticos honestos e desonestos, de esquerda e de direita, qualquer um fora ou dentro do Brasil, chamada instinto de sobrevivência. Todos querem se manter no poder. Para isso eles fazem o caminho mais fácil. Se a população colocar como o caminho mais fácil ser honesto, o eleitor não vender seu voto, exigir projetos e pode ter certeza que os projetos vão aparecer. Enquanto a população tiver como critério de escolha frequentar a festa da padroeira, ser carismático, ser do verde ou do vermelho, nascer na família certa, a gente vai continuar com o Rio Grande do Norte do jeito que está.

OM: Qual o caminho do Solidariedade: arriscar uma candidatura própria ou compor com algum partido?
KL: A gente precisa estar preparado para qualquer cenário. Então a gente primeiro está preparando uma estrutura para a manutenção do espaço na Assembleia Legislativa. Isso é fundamental para a continuidade do trabalho do partido. Estamos preparando uma proposta de discussão de chapa majoritária. O que não necessariamente é uma candidatura nem há o descarte de mantê-la. O que tem que ter é o projeto, a proposta. Nós não podemos fazer diferente disso. Temos que que estar preparados para esse momento da definição da escolha das candidaturas e poder botar na mesa esse projeto para discutir. Eu acho isso estrategicamente importante. Isso nos valoriza no processo. Agora a gente sentar na mesa para dizer que queremos eleger fulano de tal, entramos muito menores. Temos que sentar na mesa mostrando preparo e respaldo popular daquilo que a gente está defendendo, mostrando a importância daquilo administrativamente e quem quer que seja eleito precisa fazer a gente vai ser valorizado nessa hora. Ninguém administra o Rio Grande do Norte sozinho. A gente vai ter que sentar para conversar com os outros partidos e vamos fazer isso no momento adequado.

OM: O senhor defendeu que os candidatos se apresentem com o secretariado definido. O senhor vai exigir isso na hora de fazer uma composição?
KL: Exigir seria muita pretensão nossa. Se a candidatura for nossa, vai ter. Se for de outro, a gente vai sugerir. Por que defendemos isso? Porque você não apresentar o nome dos secretários é um indicativo muito forte de que você não tem projetos. Porque se você tem um projeto, alguém o elaborou. Ninguém melhor para executar um projeto quem o elaborou. Então não ter o nome dos secretários é um indicativo forte de que vamos ter mais um governo sem projeto nenhum.

OM: Como o Solidariedade vai se posicionar na eleição suplementar?
KL: O Solidariedade está estudando uma série de propostas para fazer o próximo prefeito. Nós discutimos isso no diretório municipal. A gente não quer chegar à próxima eleição de forma adesista. Quer chegar com propostas e a escolha do candidato que absorve melhor essas propostas é do diretório municipal. A gente não interfere nisso. O diretório tem toda autonomia. A gente sendo convidado a opinar, vamos opinar do ponto de vista programático. Da escolha do candidato prefiro me abster porque quem entende da política local é o local e não quem está de fora. A nossa visão, no caso de Mossoró, é muito mais estadual que municipal.

OM: Qual a saída para o Rio Grande do Norte dessa crise?
KL: Três eixos: modernização da gestão pública, projeto de desenvolvimento econômico e uma população exigente. Porque o povo é o grande vetor da transformação. É ele quem tem que exigir que o detentor de mandato eletivo seja moderno do ponto de vista da gestão pública e do desenvolvimento do Estado. Com esses três eixos, o Rio Grande do Norte começa a andar para a frente.

Bruno Barreto
Editor de Política do o Mossoroense.

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